30 de mar. de 2011

Absolvição na condenação e bênção na maldição - João Calvino


Se alguém nos perguntar como Cristo aboliu o pecado, reconciliou-nos com Deus e obteve para nós uma retidão justificadora, podemos responder que assim fez mediante todo o transcurso da Sua obediência. Uma prova disso é fornecida pelas palavras de Paulo em Rom. 5:19, "Porque, como pela desobediência de um só homem muitos se tor¬naram pecadores, assim também por meio da obediência de um só muitos se tornarão justos." Também em Gal. 4:4 ele se refere à vida toda de Cristo como o meio da nossa liber¬tação da maldição, "Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar os que estavam sob a lei." De fato, desde o momento em que tomou sobre Si a forma de um servo, começou a pagar o preço da redenção. E contudo, para de¬finir de modo mais seguro o meio da nossa salvação, as Escrituras atribuem-na de maneira especial à morte de Cris¬to. Ele mesmo diz: "O Filho do homem veio dar a sua vida em resgate por muitos" (Mat. 20:28). Paulo nos diz que "Cristo morreu pelos nossos pecados" (1 Cor. 15:3). E João Batista exclama: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!" (Jo. 1:29). Se eu fosse citar todas as passagens com significado semelhante, o número delas seria imenso. No entanto, a obediência prestada a Deus por Cristo duran¬te Sua vida precisa ser calculada como parte da Sua obra redentora. Paulo a inclui quando diz que Cristo "a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à mor¬te, e morte de cruz" (RI. 2:7-8). E é evidente que até mesmo na Sua morte grandíssima importância pertence à submis¬são voluntária da vítima divina, pois um sacrifício que não fosse oferecido de livre vontade não teria eficácia para justificarmos; daí o Senhor disse expressamente: "Ninguém tira minha vida de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou" (Jo. 10:18). E somos informados nos Evangelhos que Ele foi voluntariamente ao encontro dos soldados, e submeteu-Se a ser condenado por Pilatos sem abrir Sua boca para defender-Se.

Aqui duas coisas devem ser observadas que não somente foram preditas pelos profetas, mas também trazem à nossa fé o maior conforto e confirmação, Primeiramente, foi enviado para a morte a partir do tribunal. Por que assim? A fim de que tomasse o lugar de um pecador, porquanto Sua morte não foi por causa da Sua inocência, mas sim por causa da nossa culpa. Em segundo lugar, foi inocentado pela mesma boca que O condenou, já que Pilatos foi compelido, mais de uma vez, a dar testemunho da Sua inocência; e nisto foi cumprida a predição: "Por isso tenho de restituir o que não furtei" (Sal. 69:4). Esta compensação precisa ser especialmente lembrada, a fim de não passarmos nossa vida inteira temendo o justo juízo de Deus. O Filho de Deus transferiu aquele julgamento para Si mesmo e sofreu sua sentença.

Há um significado misterioso até mesmo no tipo de morte que Cristo padeceu. A cruz era maldita, não apenas na opinião do homem, mas também pelo decreto da lei de Deus (Deut. 21:23). Portanto, ao ser levantado sobre ela, Cristo Se colocou sob uma maldição. E isso era necessário, a fim de que a maldição merecida por nós por causa dos nossos pecados, viesse sobre Ele. Este fato foi prefigurado nos sacrifícios prescritos na lei de Moisés e foi cumprido no sacrifício de Cristo. E dessa forma ficou claro o que o profeta queria dizer, "O Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos" (is. 53:6). Para remover a contaminação da nossa iniquidade. Ele foi, por imputação, revestido dela; e o símbolo desta transferência foi a cruz, conforme o apóstolo Paulo testifica: "Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição e nosso lugar, porquê está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro; para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Cristo Jesus" (Gal. 3:13-14). De modo semelhante, Pedro nos diz que Cristo "carregou ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados" (1 Ped. 2:24), porque pela cruz que era o próprio símbolo da maldição, entendemos mais claramente que o fardo que estava nos esmagando foi colocado sobre Ele. Dessa forma, a fé apreende absolvição na condenação de Cristo e bênção na Sua maldição.

Fonte: [O Calvinista]

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