21 de out. de 2010

John Bunyan e os Efeitos do Sofrimento (1628 – 1688)



- Escrevendo para a Igreja Afligida - 

A questão, então, que eu levanto, à luz dos sofrimentos de Bunyan, é esta: qual foi o fruto do sofrimento? O que produziu em sua própria vida e, através dela, na vida de outros?
O Sofrimento de Bunyan Confirmou-o em Seu Chamado como Escritor, Especialmente para a Igreja Afligida

Provavelmente, a maior distorção da vida de Bunyan no quadro que tenho pintado até agora, é que ele omite um dos maiores labores de sua vida, que foram os seus escritos. Livros haviam despertado sua própria busca espiritual e o haviam guiado. Livros seriam o seu maior legado à Igreja e ao mundo.

É claro que ele é famoso pelo Peregrino — "além da Bíblia, [é] provavelmente o livro mais vendido do mundo ... traduzido em mais de 200 idiomas". O livro foi um sucesso imediato, com três edições em 1678, o primeiro ano em que foi publicado. A princípio, foi desprezado pela elite intelectual, mas, como Lorde Macaulay destaca, "O Peregrino é, talvez, o único livro sobre o qual, após haverem passado cem anos, a minoria educada tem concordado com a opinião do povo comum".

A maioria das pessoas, entretanto, não sabe que Bunyan foi um escritor prolífico, antes e depois do Peregrino. O índice das obras de Bunyan feita por Christopher Hill lista cinqüenta e oito títulos. A variedade destes livros é notável: livros tratando de controvérsias (como aqueles abordando os Quakers e tratando de justificação e batismo), coleções de poemas, literatura infantil, e alegorias (como The Holy War [A Guerra Santa], e The Life and Death of Mr. Badman [A Vida e a Morte do Sr. Homem-mau]). A vasta maioria, entretanto, era de exposições doutrinárias práticas das Escrituras, feitas de sermões, com o objetivo de fortalecer, avisar e ajudar os peregrinos cristãos a percorrer de forma -bem sucedida seu caminho ao céu.

Ele era um escritor, do começo ao fim. Ele já tinha escrito quatro livros antes de ser encarcerado, na idade de trinta e dois anos, e num único ano — 1688, o ano em que morreu — cinco livros foram publicados. Isto é algo extraordinário para um homem que não tinha educação formal. Ele não sabia grego nem hebraico e não tinha nenhum diploma de teologia.. Isto era algo tão humilhante em seus dias, que seu pastor, John Burton, saiu em sua defesa, escrevendo o prefácio de seu primeiro livro em 1656 (quando Bunyan tinha vinte e oito anos): "Este homem não foi escolhido de uma universidade secular, mas de uma universidade celestial, a Igreja de Cristo... Pela graça de Deus, ele adquiriu estes três diplomas celestiais, ou seja, união com Cristo, a unção do Espírito e experiências das tentações de Satanás, o que capacita um homem para aquela obra poderosa da pregação do Evangelho, mais do que toda erudição universitária e diplomas que se possa obter"

Os sofrimentos de Bunvan deixaram sua marca em todos os seus escritos. George Whitefield disse, a respeito do Peregrino, "Tem cheiro de prisão. Foi escrito quando o autor estava confinado na cadeia de Bedford. E os ministros nunca pregam ou escrevem tão bem como quando estão debaixo da cruz: o Espírito de Cristo e da glória repousa sobre eles".

O cheiro da aflição estava na maioria das coisas que Bunyan escreveu. De fato, eu suspeito que uma das razões pelas quais os Puritanos ainda são lidos hoje, com tanto proveito, é que toda a experiência deles, ao contrário da nossa, foi de perseguição e sofrimento. Para nossa cultura alegre, isto pode, por vezes, parecer sombrio, mas no dia em que você ouvir que está com câncer, ou que seu filho está cego, ou que um tumulto popular se aproxima, você vai deixar os livros leves e se voltará para os mais pesados, que, foram escritos no precipício da eternidade, onde a fragrância do céu e o fedor do inferno estão, ambos, no ar.

Os escritos de Bunyan eram uma extensão de seu ministério pastoral, principalmente para seu rebanho em Bedford, que vivia em constante perigo de assédio e prisão. Seus sofrimentos o capacitaram adequadamente para a tarefa. Isto nos leva ao segundo efeito dos sofrimentos de Bunyan que eu gostaria de mencionar.

Os Sofrimentos de Bunyan Aprofundaram Seu Amor por Seu Rebanho e Deram ao Seu Labor Pastoral a Fragrância da Eternidade

Seus escritos estão cheios de respeito ao seu povo. Por exemplo, após três anos na prisão, ele escreveu um livro para seu próprio rebanho, chamado Comportamento Cristão, que terminava desta forma:

Assim, tenho eu, em poucas palavras, escrito para vocês, antes de morrer, uma palavra para provocá-los à fé e à santidade, pois desejo que vocês, após a minha morte, tenham a vida que está reservada para todos aqueles que crêem no Senhor Jesus, e amam uns aos outros. Apesar de que, então, descansarei de meus labores, e estarei no paraíso, como seguramente creio; não é lá, mas aqui, que devo fazer o bem a vocês. Portanto, eu, sem saber a brevidade da minha vida, nem os obstáculos que daqui por diante possa ter em servir ao meu Deus e vocês, tomei esta oportunidade para apresentar-lhes estas poucas linhas, para sua edificação.

Em sua autobiografia, escrita mais ou menos até a metade, durante seu tempo de confinamento, ele falou de sua igreja e » dos possíveis efeitos que seu martírio teria sobre eles: "Freqüentemente disse, diante do Senhor, que, se o ser enforcado sem demora diante de seus olhos, for o meio de despertar neles a verdade, e confirmá-los nela, consentiria nisto com satisfação". Na verdade, muitos de seu rebanho se juntaram a ele na prisão e Bunyan ministrou-lhes ali. Ele ecoou as palavras de Paulo, quando descreveu seus profundos sentimentos por eles: "Na minha pregação tenho sentido, realmente, muita dor; tenho tido dores, como de parto, para dar filhos para Deus".

Ele se gloriava no privilégio de ser ministro do Evangelho. Isto, também, fluía de seu sofrimento. Se tudo vai bem e se tudo o que importa é este mundo, o pastor pode sentir inveja das pessoas prósperas que empregam seu tempo no ócio. Mas, se o sofrimento abunda, e se a prosperidade é uma capa para encobrir a verdadeira condição espiritual de pessoas perdidas que são folgazonas e amantes da diversão, então, ser um pastor pode ser, talvez, o mais importante e glorioso de todos os trabalhos. Bunyan achava que era: "Meu coração tem sido tão envolto na glória desta obra excelente, que me considerei mais abençoado e honrado por Deus por isto, do que se ele me tivesse feito o imperador do mundo cristão, ou o senhor de toda a glória da terra sem isto".

Ele amava seu povo, ele amava seu trabalho, e ele permaneceu com ele e com eles até o fim de sua vida. Ele serviu a eles e serviu ao mundo, da paróquia de uma vila com talvez 120 membros.

Os Sofrimentos de Bunyan Abriram seu Entendimento para a Verdade de que a Vida Cristã é Difícil, e que Seguir a Jesus Significa Ir Contra o Vento

Em 1682, seis anos antes de sua morte, ele escreveu um livro intitulado The Greatness of the Soul (A Grandeza da Alma), baseado em Marcos 8.36-37, "Pois que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou o que o homem poderia dar em troca de sua alma?" Ele diz que seu alvo é "despertar vocês, levantar vocês de suas camas de tranqüilidade, segurança e prazer, e fazer com que se ajoelhem diante dele, para suplicar-lhe a graça para ficarem preocupados quanto à salvação de suas almas". Com isto, ele não se refere à conversão, mas ao processo de perseverança. "Mas aquele que perseverar até o fim será salvo" (Mc 13.13). Ele ouve Jesus avisando-nos de que a vida com ele é difícil:

Seguir-me não é como seguir ... alguns outros mestres. O vento é sempre contrário, e a ira espumante do mar deste mundo e suas ondas, altas e orgulhosas, golpeiam continuamente os lados do barco ou do navio em que eu mesmo, minha causa e meus seguidores nos encontramos; portanto, que não ponha o pé nesta nau aquele que não deseja correr riscos, e que tem receio de se arriscar a morrer afogado.

Dois anos mais tarde, comentando João 15.2 ("Todo ramo ... que dá fruto ele poda"), ele diz, "E a vontade de Deus que aqueles que vão para o céu, cheguem lá, de forma custosa ou com dificuldades. É com dificuldade que o justo se salva. Isto é, eles serão salvos, mas com grande dificuldade, para que possa ser o mais doce possível".

Os sofrimentos de Bunyan fizeram com que ele sentisse intensamente estas coisas - e que fosse paciente. Você pode ouvir a empatia dele para com pessoas que estão em conflito, nestas palavras tipicamente terrenas, num livro de 1678, chamado Come and Welcome to Jesus (Venha e Receba a Jesus Cristo):

Aquele que vem a Cristo, não pode, é verdade, sempre ir em frente tão rápido quanto gostaria. Pobre alma que está vindo a Cristo, tu és como o homem que gostaria de andar a cavalo a todo galope, mas cujo cavalo mal pode trotar. O desejo de sua mente não pode ser julgado pelo passo lerdo do matungo vagaroso que ele está montando, mas pelos puxões, chutes e esporeadas que ele dá, montado no cavalo. Tua carne é como este matungo lerdo, que não galopará seguindo a Cristo, mas que será moroso, ainda que o céu e tua alma estejam em jogo.

Parece-me que Bunyan sabia o equilíbrio de Filipenses 2.12-13, "Assim, meus amados, ... desenvolvam a salvação de vocês com temor e tremor, pois é Deus quem efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar, de acordo com a boa vontade dele". Primeiro, ele publica um livro chamado Saved by Grace (Salvo pela Graça) baseado em Efésios 2.5, "pela graça vocês são salvos". E no mesmo ano, ele dá continuidade com um livro intitulado The Strait Gate (A Porta Estreita), baseado em Lucas 13.24, "Esforcem-se para entrar pela porta estreita, porque eu lhes digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão".

Os sofrimentos de Bunyan lhe haviam ensinado, em primeira mão, as palavras de Jesus: "Como é estreita a porta, e apertado o caminho que leva à vida! Poucos são os que a encontram" (Mt 7.14).

Os Sofrimentos de Bunyan Fortaleceram Sua Certeza de que Deus é Soberano sobre Todas as Aflições de Seu Povo, e que ele os Levará em Segurança ao Lar

Sempre houve, como há hoje, pessoas que tentam resolver o problema do sofrimento, negando a soberania de Deus — isto é, o governo providencial de Deus sobre Satanás, a natureza e o coração do homem. Mas é notável como muitos dos que defendem a doutrina da soberania de Deus sobre o sofrimento, têm sido os que mais sofreram e que mais encontraram nesta doutrina o maior conforto e ajuda.

Bunyan estava entre estes. Em 1684 ele escreveu uma exposição bíblica para seu povo sofredor, baseada em IPedro 4.19, "Por isso, também aqueles que sofrem de acordo com a vontade de Deus devem entregar suas vidas ao seu fiel Criador e praticar o bem". O livro foi intitulado Seasonable Counsel, or Advice to Sufferers (Conselho Oportuno, ou Recomendação aos Sofredores). Ele toma a frase "de acordo com a vontade de Deus" e expõe a soberania de Deus ali implícita para o conforto de seu povo.

O que será feito não é o que os inimigos desejam nem o que decidiram, mas o que Deus deseja e o que ele determina.... E, como nenhum inimigo pode trazer sofrimento sobre uma pessoa, contrariamente à vontade de Deus, assim também ninguém pode se salvar das mãos dos inimigos, quando Deus [determinou] entregá-lo para sua glória         [como Jesus mostrou a Pedro "o tipo de morte com a qual Pedro iria glorificar a Deus", João 21.19]. Sofreremos ou deixaremos de sofrer conforme lhe agrada.

Assim, Deus tem designado as pessoas que sofrerão, o tempo, o lugar e o modo de seu sofrimento.

John Piper



Fonte: [Josemar Bessa]

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